Lopes, Cátia Sofia Duarte. "Polymorphism in hydroxybenzoyl compounds: structure and energetics." Master's thesis, 2016. http://hdl.handle.net/10451/25215.
Abstract:
Tese de mestrado em Química, apresentada à Universidade de Lisboa, através da Faculdade de Ciências, 2016<br>O trabalho apresentado nesta tese foi realizado no Grupo de Energética Molecular (GEM), do Centro de Química e Bioquímica da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Um dos temas principais desenvolvidos ao longo dos anos no GEM, prende-se com o estudo da relação entre a energética e a estrutura das moléculas, nomeadamente em sólidos moleculares orgânicos. A abordagem deste tema tem seguido duas linhas de investigação ligeiramente distintas. Na primeira, são estudados sistemas modelo, normalmente constituídos por pequenas moléculas (poucas dezenas de átomos), pouco dispendiosos e que podem ser facilmente manipulados. Estes estudos têm como objetivo estabelecer relações causa-efeito como, por exemplo, averiguar como uma determinada alteração na estrutura de uma molécula, implica mudanças no empacotamento em estado sólido e, consequentemente, nas propriedades físicas. Na segunda linha, os conhecimentos retirados do estudo dos sistemas modelo, são aplicados diretamente ao estudo de compostos com interesse comercial. De facto, este tipo de estudo é de extrema importância para as indústrias que usam formulações orgânicas no estado sólido, onde a indústria farmacêutica se destaca, devido à grande variedade de princípios ativos farmacêuticos que são utilizados em estado sólido.
Quando se trabalha com sólidos moleculares cristalinos por vezes, uma mesma molécula pode organizar-se com diferentes arranjos tridimensionais. A este fenómeno dá-se o nome de polimorfismo. Dado que cada forma cristalina pode apresentar diferentes propriedades físicas (e.g. cor, temperatura de fusão e solubilidade), o controlo e previsão deste fenómeno é hoje em dia crucial para a indústria. Por exemplo, para a indústria farmacêutica, se duas formas cristalinas do mesmo composto apresentarem solubilidades distintas, podem conduzir a uma biodisponibilidade diferente do medicamento no organismo do paciente. Apesar de poderem existir vários polimorfos para uma molécula em determinadas condições de pressão e temperatura, apenas uma dessas formas é termodinamicamente estável. Assim, caso não existam barreiras cinéticas, todas as formas metastáveis tendem a evoluir para a fase mais estável. Neste sentido, torna-se importante conhecer a relação energética entre as fases, a fim de evitar problemas durante, e.g. processos de armazenamento. Estes tipos de problemas podem, por esse motivo, levar a uma eventual recolha dos medicamentos baseados num dado principio ativo, e assim levar a perdas monetárias muito elevadas para a indústria.
É de realçar, no entanto, que se o polimorfismo for bem compreendido e controlado, pode levar ao desenvolvimento de novos materiais, que possuem características físicas diferentes do material de partida, que podem ser ajustadas para uma determinada aplicação sem alterar a molécula inicial. Este facto, mostra que é de todo o interesse conhecer quais os vários polimorfos existentes para cada molécula, e estudar a maneira mais adequada para os preparar e controlar.
É neste âmbito que surge o trabalho que foi desenvolvido nesta tese. Este foi realizado como continuação dos estudos iniciados no GEM para os compostos 4’-hidroxiacetofenona e 4-hidroxibenzaldeído. Ambos podem ser considerados sistemas modelo que pertencem à família de compostos do tipo 4-hidroxibenzoílos (HOC6H4COR). Estes revelaram-se ser compostos com a capacidade para gerar polimorfos, pois tanto para a 4’-hidroxiacetofenona (R = CH3) como para o 4-hidroxibenzaldeído (R = H) já foram identificadas duas formas cristalinas diferentes. Para além destas, no caso da 4’-hidroxiacetofenona, foram também identificados três hidratos. A razão principal que leva a esta diversidade parece estar relacionada com a capacidade destas moléculas poderem formar diferentes tipos de ligações de hidrogénio como OH∙∙∙O, CH∙∙∙Ocarbonilo e CH∙∙∙Ohidroxilo, permitindo diferentes empacotamentos cristalinos. Para além disso, do ponto de vista conformacional, nesta família de compostos, as moléculas podem ainda adotar duas conformações distintas, que diferem na orientação do átomo de hidrogénio do grupo hidroxilo relativamente ao grupo carbonilo. Assim, um dos objetivos principais deste trabalho foi verificar de que forma um aumento do tamanho da cadeia alquilo, i.e. a introdução de um grupo apolar R progressivamente maior, influencia a formação de diferentes estruturas cristalinas. Para isto foram selecionadas quatro moléculas, em adição à 4’-hidroxiacetofenona e 4-hidroxibenzaldeído, aumentando a cadeia carbonada consecutivamente, através da adição de grupos CH2. Neste sentido, foi realizado um estudo sistemático da energética e das estruturas cristalinas da 4’-hidroxipropiofenona (R = C2H5), da 4’-hidroxibutirofenona (R = C3H7), da 4’-hidroxivalerofenona (R = C4H9) e da 4’-hidroxiheptanofenona (R = C6H13).
O ponto de partida para o desenvolvimento deste trabalho, foi a caracterização energética para os compostos selecionados, dada a ausência na literatura de dados fiáveis para estes compostos. Este estudo envolveu várias etapas: i) a determinação das temperaturas de fusão e respetivas entalpias de fusão molares padrão (po = 1 bar) , ΔfusHmo, por calorimetria diferencial de varrimento; ii) a avaliação da entalpia de vaporização molar padrão, Δvap𝐻mo, da 4’-hidroxivalerofenona e 4’-hidroxiheptanofenona, e de sublimação molar padrão, Δsub𝐻mo, da 4’-hidroxipropiofenona e 4’-hidroxibutirofenona, por microcalorimetria Calvet; iii) a determinação das capacidades caloríficas molares padrão dos compostos por calorimetria diferencial de varrimento, de forma a possibilitar a correção dos valores de Δvap𝐻mo e Δsub𝐻mo obtidos nas condições experimentais, para entalpias de sublimação molares padrão à temperatura de referência de 298,15 K, ΔsubHmo(298,15) iv) o cálculo das entalpias de formação molar padrão em estado sólido, ΔfHmo(cr), a partir dos valores de ΔsubHmo(298,15) e das entalpias de formação molar padrão em fase gasosa, ΔfHmo (g), à temperatura de 298,15 K. Este trabalho foi recentemente publicado (C. S. D. Lopes, F. Agapito, C. E. S. Bernardes, M. E. Minas da Piedade Thermochemistry of 4-HOC6H4COR (R = H, CH3, C2H5, n-C3H7, n-C4H9, n-C5H11, and n-C6H13) Compounds; J. Chem. Thermodyn. 2016, DOI: 10.1016/j.jct.2016.09.026). Foi realizada uma correlação linear entre as entalpias de sublimação molares padrão a 298,15 K dos compostos com o número de átomos de carbono (R2 = 0,986). Este resultado sugere que apesar dos diferentes empacotamentos cristalinos existentes entre as várias formas a energia de coesão é aditiva, com um aumento por cada CH2 de 6,6±0,6 kJ∙mol-1.
A procura de novos polimorfos nos compostos estudados foi realizada, numa primeira etapa, pela verificação da existência de transições de fase e avaliando as temperaturas de fusão dos materiais, por calorimetria diferencial de varrimento. De uma forma geral, os ensaios realizados com os materiais de partida, não revelaram a existência de transições de fase entre a temperatura ambiente e de fusão. No caso da 4’-hidroxivalerofenona (HVP), após avaliar a fusão da amostra, esta foi ainda submetida a ciclos de aquecimento/arrefecimento. Este estudo revelou que o material que precipita a partir do líquido isotrópico da HVP, não apresenta transições de fase na gama de temperaturas estudada (153 K a 453 K). No entanto, a temperatura e entalpia de fusão são significativamente diferentes em relação à amostra inicial: enquanto o composto de partida (forma I), que é preparado por cristalização em etanol, apresenta uma temperatura de fusão de 334,2±0,7 K, e uma entalpia de fusão molar padrão de 25,75±0,26 kJ·mol-1, a que precipita a partir do líquido isotrópico (forma II), funde a 324,0±0,2 K e tem uma entalpia de fusão molar padrão de 18,14±0,18 kJ∙mol-1. Utilizando os valores de entalpia e temperatura de fusão, foi possível concluir que a forma I é termodinamicamente mais estável que a forma II, e que estas se encontram relacionadas monotropicamente. Os resultados destes estudos termoanalíticos sobre o polimorfismo na HVP foram já submetidos para publicação estando a aguardar o resultado da avaliação (C. S. D. Lopes, C. E. S. Bernardes, M. F. M. Piedade, H. P. Diogo, M. E. Minas da Piedade; A New Polymorph of 4′-Hydroxyvalerophenone Revealed by Thermoanalytical and X-ray Diffraction Studies; Eur. Phys. J.). A identificação deste novo polimorfo da HVP foi ainda verificada através de estudos de difração de raios-X de cristal único, os quais permitiram determinar a organização molecular desta nova fase em estado sólido. Para além destes resultados para a 4’-hidroxiheptanofenona (HHP), recorrendo a dados de difração de raios-X de cristal único, foram resolvidas quatro estruturas a diferentes temperaturas (150 K, 190 K, 220 K e 293 K) e identificada uma transição de fase entre 190 K e 220 K. Verificou-se que todas estas estruturas são ortorrômbicas, sendo que a transição de fase que ocorre, leva à alteração do grupo espacial, de P212121 para Pnma, confirmando assim a existência de polimorfismo na molécula. Esta transição também foi identificada por calorimetria diferencial de varrimento. Finalmente, a partir da análise dos dados de difração de raios-X de cristal único das diferentes formas, foi possível verificar que as transições de fase sólido-sólido envolvem modificações conformacionais da cadeia alquilo nas moléculas de HHP, sem que existam alterações significativas da estrutura a nível tridimensional.<br>During the recent years, in the Molecular Energetics Group, Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, an effort to systematically investigate the structure/energetic relation in molecular crystalline materials has been undertaken. One of the studies performed in this scope, involved the investigation of the 4’-hydroxybenzoyl family (HOC6H4CO-R), by searching for the existence of polymorphs (crystal phases with different molecular arrangements) of 4-hydroxybenzaldeheyde (R = H) and 4’-hydroxyacetophenone (R = CH3), and relating this information with energetic data. In this work, the previous existing results were expanded for compounds with R = C2H5, n-C3H7, n-C4H9 and n-C6H13.
The thermochemistry of the compounds was investigated by determining their enthalpies of formation, fusion, vaporization and/or sublimation. These measurements were performed by Calvet-drop microcalorimetry and W1-F12 and CCSD(T)-F12 level of theory. Standard (po = 1 bar) molar enthalpies of formation in the solid, ΔfHmo (cr), and gaseous, ΔfHmo (g), states at 298.15 K were determined for the complete family of compounds studied in this work. A linear correlation was found when the ΔsubHmo (298.15 K) values were plotted as a function of the number of carbon atoms in the alkyl side chain (nc), with a CH2 increment of 6.6±0.6 kJ∙mol-1. Despite the differences in the molecular packing between the crystalline compounds their cohesive energies are approximate additivity.
Regarding the polymorphism studies, a new phase of 4’-hydroxyvalerophenone was discovered from differential scanning calorimetry, X-ray powder diffraction and single crystal X-ray diffraction. This novel form (form II) was obtained by crystallization from the melt. It presents a fusion temperature of Tfus = 324.3±0.2 K and an enthalpy of fusion ΔfusHmo = 18.14±0.18 kJ·mol-1. These values are much lower than those obtained for the previously known phase (form I, Tfus = 334.6±0.7 K; ΔfusHmo = 25.7±5.26 kJ·mol-1), which can be prepared by crystallization from ethanol. These results suggest that form I is thermodynamically more stable than form II and both are monotropically related. Finally, for 4’-hydroxyhepatnophenone, four different structures at different temperatures (T = 150 K; 190 K; 220 K and 298 K) were solved by single crystal X-ray diffraction. A phase transition at 203 K was detected by DSC which corresponds to a new polymorph. The two forms are enantiotropicly related.